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Foto do escritorValkiria Assis

Muito Além do Peso: entenda os fatores que contribuem para obesidade infantil



A influência da publicidade na alimentação infantil é alvo de debate há anos. Os documentários “Criança, a Alma do negócio” e “Muito além do peso” demonstram como os pântanos alimentares (locais com alta oferta de alimentos ultraprocessados) em conjunto com os desertos alimentares (onde há uma escassez de alimentos in natura), contribuem para obesidade infantil.



Ultraprocessados chegam onde alimentos naturais não chegam, essa inversão de alimentos que seriam adequados ao consumo frequente faz com que crianças não saibam identificar vegetais comuns como frutas e batatas.


A alimentação é um dos fatores mais importantes para prevenção e tratamento de doenças. O consumo de alimentos ultraprocessados leva ao aumento de mortes por todas as causas e doenças cardiovasculares.

Em 2008, dados do IBGE revelaram que 33,5% das crianças no Brasil estavam em situação de sobrepeso ou obesidade. O Vigitel de 2019 apontou que 55,4% da população brasileira estava com excesso de peso e 19,8% com obesidade.


Dados atuais da OMS revelam que mais de 1 bilhão de pessoas no mundo estão obesas – 650 milhões de adultos, 340 milhões de adolescentes e 39 milhões de crianças.


A obesidade pode gerar comorbidades como diabetes, doenças cardiovasculares, câncer, ansiedade e depressão. No documentário “Muito além do peso” são apresentadas crianças que já fazem uso de medicação para tratamento de doenças crônicas não transmissíveis. Condições clínicas que são comuns na terceira idade, quando apresentadas em crianças, configuram a gravidade do adoecimento precoce coletivo.



O aumento da exposição a telas, associado ao sedentarismo e redução do brincar criativo (por limitações físicas e psicológicas), são fatores importantes que levam ao aumento dos índices de obesidade e sobrepeso.


Campanhas multimilionárias da indústria alimentícia usam personagens, brinquedos e outros recursos para convencer crianças e, consequentemente, os pais, a comprarem determinado produto.


A prática de atividade física, assim como o padrão alimentar, vão muito além de uma escolha individual dos pais e da criança, pois permeiam escolhas complexas que são influenciadas pelo ambiente, segurança pública, política, condições socioeconômicas, entre outros fatores. O documentário ilustra como renda, uso de transporte público, segurança, tiroteios, educação, acessibilidade a locais que oferecem atividades físicas são fatores que dificultam ou impedem a prática de exercícios físicos por pais e crianças, criando um ciclo vicioso de sedentarismo e aumento de peso.


Uma pesquisa da UNIFESP aponta que 56% dos bebês tomam refrigerante frequentemente antes do primeiro ano de vida. Hábitos alimentares formados na infância tem tendência de se perpetuar ao longo da vida dos indivíduos. Por isso trocar leite materno por refrigerantes é algo tão grave, muitas famílias fazem isso sem ter noção dos riscos que essa apresentação precoce e frequente aos ultraprocessados pode gerar ao longo da vida.


A forma com que esses produtos são apresentados, geram falsas impressões de benefícios à saúde. Grande parcela da população acredita que sucos em pó e néctar são equivalentes a sucos de frutas naturais.


No documentário várias famílias são entrevistadas e demonstram desconhecimento sobre a quantidade de gordura e açúcar de alimentos ultra processados como salgadinhos, bolachas recheadas, gelatinas, refrigerantes entre outros.


Além disso, não basta saber que o refrigerante é prejudicial para mudar hábitos alimentares, pois a indústria associa produtos ao bem estar, saúde e sucesso. Exemplos são alegações como “abra a felicidade", propagandas de salgadinhos para adolescentes com associações de realização amorosa, popularidade e corpos sarados.


O excesso de peso na infância traz outras consequências que vão além das alterações físicas. A gordofobia (preconceito que pessoas gordas sofrem pelo tamanho dos seus corpos) é expressa de diferentes formas, incluindo o bullying nas escolas e no ambiente familiar. Os maus tratos (físicos e psicológicos) sofridos pelo

excesso de peso são danosos para autoimagem da criança, que em muitos casos continua carregando o peso desses traumas até mesmo ao atingir um “peso ideal”. A exposição a telas já é um problema antigo, dados do documentário “Muito além do peso'' já indicavam que crianças aumentam o consumo de alimentos junk food em 134% quando expostas à publicidade. Com a pandemia da Covid-19, o tempo de exposição às telas aumentou, assim como o sedentarismo e sobrepeso entre crianças.


As telas podem gerar danos diversos à saúde ocular e ao desenvolvimento cognitivo das crianças, além de estarem associadas ao desenvolvimento do transtorno da compulsão alimentar periódica (TCAP). As recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) são que crianças com menos de 2 anos de idade não sejam expostas a telas, de 2 a 5 anos a exposição deve ser de no máximo 1 hora e com supervisão de um adulto, de 6 à 10 anos a recomendação é de no máximo 1 à 2 horas por dia, e de 11 a 18 anos de 2 a 3 horas por dia.


Educação nutricional precisa fazer parte da grade curricular das escolas, a alimentação é uma área que está presente do início ao fim da vida, saber como usá-la para ter uma boa relação com a comida e prevenir o desenvolvimento de pessoas, é no mínimo, essencial. Assim como as cantinas escolares devem fazer parte do processo educacional, e não um mero instrumento comercial incoerente com escolhas saudáveis.


No documentário “Criança a alma do negócio”, é relatado como as marcas influenciam a compra de produtos através da vulnerabilidade de crianças, que por sua vez tem alto poder de convencimento dos pais na escolha dos itens comprados pela família.


Desde o início da vida ensinam crianças que alimentos e objetos (brinquedos por exemplo) são as formas mais adequada de lidar com suas frustrações, isso preenche o vazio existencial e faz com que elas busquem novos produtos, gerando um ciclo vicioso de frustrações.


O consumismo estimulado desde a infância, pouco conhecimento sobre a natureza (incluindo alimentação natural), uso descontrolado da tecnologia, geram compra de produtos que captam por pouco tempo o interesse das crianças, criando a necessidade de adquirir um novo produto.


Para além da alimentação, meninas são induzidas à compra de produtos como maquiagens, alisamento, moda, e bonecas do tipo barbie que podem gerar insatisfação corporal.


O documentário também trata da expectativa das meninas em conseguir um namorado com 8 anos de idade, o que é extremamente grave, pois uma das consequências da perda da infância e estímulo precoce da sexualidade são os casos de gravidez na adolescência no Brasil.


Os documentários deixam claro que a obesidade e o sobrepeso se tratam de condições multifatoriais, portanto não se deve culpabilizar o indivíduo ou seus pais, mas sim ter ações voltadas a diferentes fatores para proteção da infância.


A recomendação da OPAS para tratamento da obesidade sugere que os países se unam num trabalho conjunto para melhora do ambiente alimentar. Medidas eficazes são: restrição do marketing de alimentos ultraprocessados para crianças; taxação de bebidas açucaradas; aumentar a oferta e o acesso de alimentos in natura e minimamente processados; estruturas seguras para prática de atividades físicas; educação alimentar e nutricional nas escolas; entre outras ações.


Nutricionista Valkiria Assis

CRN-3 71936/P


Referências:

ABESO. Mapa da Obesidade. Disponível em:


Instituto Alana e Maria Farinha Filmes, “Muito Além do Peso,” Biblioteca - Portal do Consumo Responsável, acesso em 20 de abril de 2022,


CRIANÇA, a alma do negócio. Produção: Estela Renner e Marcos Nisti. São Paulo: Maria Farinha Produções, 2008. Disponível em:


CNN. Aumento da exposição às telas, ampliado pela pandemia, pode prejudicar a visão. 2021.


CNN. Uso excessivo de telas aumenta risco de compulsão alimentar em crianças. 2021.


OPAS. Dia Mundial da Obesidade 2022: acelerar ação para acabar com a obesidade. 2022. Disponível em:


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